NEGAÇÃO | Crítica

A tensão não cresce e a emoção não é plantada.

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Negação é o mais recente trabalho do realizador Mick Jackson, que aos 74 anos de idade nos trás um filme sobre um dos casos jurídicos mais importantes do final do século XX, onde é debatida a veracidade dos factos que comprovam, ou não, a ocorrência do Holocausto como descrito até aos dias que correm. Desde 2010 que Mick estava sem entregar um trabalho como realizador, ano em que realizou Temple Grandin, um tele filme que foi muito bem recebido pela critica e pelo público no geral.

Na grande tela, Mick, nunca teve uma obra notável…e continua sem ter. Negação é um filme com uma equipa extraordinária, desde a própria Deborah Lipstadt, réu no processo em questão, a ajudar na adaptação da história; David Hare como argumentista principal, depois de participar em projectos como O Leitor (2008) e Página 8 (2011), filme onde já se havia cruzado com a atriz que protagoniza esta obra, a bela Rachel Weisz, que para uma larga geração de novos fãs da sétima arte será sempre lembrada pela sua participação em filmes, não tão brilhantes, como A Múmia.

Rachel é uma actriz brilhante e este filme fez todos os possíveis para o esconder. Acaba sempre por ser frustrante vermos que uma pessoa tão talentosa acaba por ficar esquecida debaixo de um argumento que a impede de crescer. Porém, esses são os riscos assumidos da representação cinematográfica de um evento real; por muitas voltas que queiramos dar, os actores terão sempre de ser limitados por aquilo que aconteceu na realidade. Uma pena.

Mas se Deborah Lipstadt era réu num processo, é de fácil percepção a existência de uma pessoa que a esteja a acusar, neste caso falamos de David Irving, historiador que acusou Deborah de difamação por afirmar que esta não teria fundamento para desacreditar os seus estudos sobre a não existência do Holocausto. Essa personagem que serve de mote e pilar para toda a história, já que Deborah pouca expressão tem no processo, ficou entregue à responsabilidade de Timothy Spall, conhecido por participações como um “vilão de segunda linha” em filmes como Harry Potter e o Cálice de Fogo (2005) e Sweeney Todd: O Terrível Barbeiro de Fleet Street (2007). Uma prestação fenomenal de um ator que se vê muitas vezes dexado para trás noutros enredos, mas que aqui conseguiu mostrar o seu potencial tremendo como antagonista principal.

A história do filme decorre ao longo de aproximadamente uma década, não entrando em detalhes das vidas privadas dos intervenientes, vemos o desenrolar do enredo, todo ele, praticamente, na sala do tribunal. Se por um lado ficamos esclarecidos sobre qual a verdadeira história central do filme, por outro, é ignorado qualquer tipo de aprofundamento de personagem que poderia ser feito, já que só vemos as personagens a agir e reagir dentro do foco principal, sem nunca aproveitando momentos mais “recatados” do guião para mostrar quem são, enquanto pessoas, as personagens.

Toda a imagem é despida de emoção. Não nos vamos perder em imagens que nos passem emoções nem que criem ambientes, tudo o que está para além dos atores é apenas decoração não pensada, em nenhuma parte nos deixamos impressionar por aquilo que foi retratado pelas câmaras. Não nos perdemos da história, mas não ficamos presos ao ecrã por si só. O mesmo se pode dizer da banda sonora, que, como em qualquer drama que se prese, acaba por ser um misto de músicas calmas com calmas músicas. A tensão não cresce, a emoção não é plantada e nunca temos um momento de ficar preso à cadeira na ânsia do que poderá acontecer a seguir.

https://www.youtube.com/watch?v=yRbVwPO0r48

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Claro que a história, que retrata acima de tudo a liberdade, é o que segura todo o argumento. O filme termina com um pequeno discurso sobre a importância da liberdade e da liberdade de expressão, porém, sobre como a mesma deve ser usada de forma cautelosa. Afinal de contas, se todos podemos dizer o que queremos, é possível que comecem a surgir pessoas que defendam pontos de vista indescritíveis, ou que simplesmente desacreditem um marco tão importante da história moderna como o Holocausto, bem como, todas as suas consequências.

Negação é um filme que retrata uma história que começou há mais de 20 anos, mas é tão atual que acreditamos que o mesmo possa acontecer na próxima semana.

Achas que um processo destes pode voltar a acontecer?